Miguel Arraes de Alencar

1916 - 2005
"Doutor Miguel Arraes nao vai ser enterrado. Vai ser plantado". Uma frase como essa nao precisa de interpreta�ao. Ela � simples no seu significado. Tao simples como o homem do campo que a pronunciou, quase como uma tentativa de consolo pr�prio, menos pela perda do homem Arraes, e muito mais pelo desaparecimento de um her�i do povo.
Aquele cuja imagem sofreu todo tipo de ataque dos opositores, porque incomodava, mas que, no imagin�rio dos "p�s descal�os", dos "exclu�dos" - como ele chamava - deve continuar intocada.
Miguel Arraes era um homem de bem, na acep�ao da palavra. Polemico. As vezes duro. Quase sempre d�cil. Um negociador h�bil at� com os advers�rios, que s� se recusou a negociar com seus carrascos, em 1964. Para muitos, era um pol�tico dif�cil de ser interpretado, porque nao gostava de falar muito. Mas era por seus gestos e atitudes que se podia entender o que ele queria dizer.
Foi isso que aprendi em quase duas d�cadas de jornalismo, tempo em que mantive muitos contatos com o "velho". Terminei premiado, se posso dizer assim, por ter sido a mim que ele concedeu sua �ltima, e longa, entrevista. Foi para a s�rie sobre os vinte anos da Nova Rep�blica - publicada pelo JC entre janeiro e mar�o de 2005 - e reeditada no caderno especial publicado neste domingo.
O encontro foi partilhado pelo cientista pol�tico e amigo T�lio Velho Barreto e pelo companheiro Paulo S�rgio Scarpa, colunista do JC e um homem apaixonado por Arraes como poucos que conheci. Foram quase tres horas de conversa sobre pol�tica na mais pura essencia. O "doutor" falava com a mesma facilidade sobre conjuntura municipal, sobre o cen�rio nacional e sobre pol�tica internacional, sem perder o bom-humor caracter�stico. Fomos brindados, naquele dia, com v�rias das suas boas gargalhadas.
No s�bado, ao ouvir a frase do matuto sobre o "Pai Arraia", como era chamado nas suas tumultuadas visitas ao Sertao - que lhe valeram o apelido de "acaba-feira" - ca� na real: Arraes morreu! E o duro � saber que isso significa, acima de tudo, o fim de uma gera�ao de pol�ticos com P mai�sculo, que com suas lutas populares marcou a agitada segunda metade do S�culo 20.
Era uma gente que nada tinha a ver com essa "politiquinha" que se faz hoje. Ou "politicagem", se preferir o leitor. Miguel Arraes foi juntar-se a homens como Leonel Brizola, Tancredo Neves, Ulysses Guimaraes, Lu�s Carlos Prestes, Joao Goulart, Juscelino Kubitscheck, e outros tantos. Ideologias - e simpatias - a parte, essa foi uma gera�ao se esfor�ou para deixar aos seus descendentes pol�ticos um exemplo bravo de luta. Uma li�ao que, lamentavelmente, poucos aprenderam.
Arraes nao gostava de ser chamado de mito. Dizia que nao era infal�vel. E nao era. Como pol�tico, havia os que o antipatizavam, criticavam ou condenavam por seus atos. E como homem comum, ele tamb�m tomou decisoes erradas e fez desafetos.
Mas tamb�m enfrentou situa�oes diante das quais muitos homens comuns poderiam ter sucumbido. Imagine entrar na pol�tica pensando em trabalhar pelo bem comum, pelo homem do campo, pelos pobres. De repente, exatamente por causa desse ideal, foi declarado inimigo do Estado, preso, deposto do cargo para o qual foi eleito pelo voto popular livre, e condenado a viver por quase vinte anos no exterior, proibido de retornar ao seu Pa�s.
Assim foi com Miguel Arraes e com v�rios outros. Alguns voltaram, mas desistiram de lutar. Outros amargaram seq�elas permanentes. O ex-governador deposto optou por levantar a cabe�a e buscar, novamente, o campo de batalha.
Nacionalista, por�m aberto as mudan�as no mundo. Duro cr�tico dos oligarcas e dos monop�lios. Defensor ardoroso do homem simples, oprimido. Assim era Miguel Arraes.
Mas Arraes tamb�m era o marido de Madalena, pai de dez filhos, avo, bisavo. Gostava de arte e literatura. Fumava cachimbo e charuto. Apreciava um bom u�sque e a comida regional. Um retrato modesto de um homem de bem, que tirou da vida o que ela pode lhe oferecer, sem reclamar mais. E deixou uma enorme li�ao de humanidade.
S� temos que agradecer.
Aquele cuja imagem sofreu todo tipo de ataque dos opositores, porque incomodava, mas que, no imagin�rio dos "p�s descal�os", dos "exclu�dos" - como ele chamava - deve continuar intocada.
Miguel Arraes era um homem de bem, na acep�ao da palavra. Polemico. As vezes duro. Quase sempre d�cil. Um negociador h�bil at� com os advers�rios, que s� se recusou a negociar com seus carrascos, em 1964. Para muitos, era um pol�tico dif�cil de ser interpretado, porque nao gostava de falar muito. Mas era por seus gestos e atitudes que se podia entender o que ele queria dizer.
Foi isso que aprendi em quase duas d�cadas de jornalismo, tempo em que mantive muitos contatos com o "velho". Terminei premiado, se posso dizer assim, por ter sido a mim que ele concedeu sua �ltima, e longa, entrevista. Foi para a s�rie sobre os vinte anos da Nova Rep�blica - publicada pelo JC entre janeiro e mar�o de 2005 - e reeditada no caderno especial publicado neste domingo.
O encontro foi partilhado pelo cientista pol�tico e amigo T�lio Velho Barreto e pelo companheiro Paulo S�rgio Scarpa, colunista do JC e um homem apaixonado por Arraes como poucos que conheci. Foram quase tres horas de conversa sobre pol�tica na mais pura essencia. O "doutor" falava com a mesma facilidade sobre conjuntura municipal, sobre o cen�rio nacional e sobre pol�tica internacional, sem perder o bom-humor caracter�stico. Fomos brindados, naquele dia, com v�rias das suas boas gargalhadas.
No s�bado, ao ouvir a frase do matuto sobre o "Pai Arraia", como era chamado nas suas tumultuadas visitas ao Sertao - que lhe valeram o apelido de "acaba-feira" - ca� na real: Arraes morreu! E o duro � saber que isso significa, acima de tudo, o fim de uma gera�ao de pol�ticos com P mai�sculo, que com suas lutas populares marcou a agitada segunda metade do S�culo 20.
Era uma gente que nada tinha a ver com essa "politiquinha" que se faz hoje. Ou "politicagem", se preferir o leitor. Miguel Arraes foi juntar-se a homens como Leonel Brizola, Tancredo Neves, Ulysses Guimaraes, Lu�s Carlos Prestes, Joao Goulart, Juscelino Kubitscheck, e outros tantos. Ideologias - e simpatias - a parte, essa foi uma gera�ao se esfor�ou para deixar aos seus descendentes pol�ticos um exemplo bravo de luta. Uma li�ao que, lamentavelmente, poucos aprenderam.
Arraes nao gostava de ser chamado de mito. Dizia que nao era infal�vel. E nao era. Como pol�tico, havia os que o antipatizavam, criticavam ou condenavam por seus atos. E como homem comum, ele tamb�m tomou decisoes erradas e fez desafetos.
Mas tamb�m enfrentou situa�oes diante das quais muitos homens comuns poderiam ter sucumbido. Imagine entrar na pol�tica pensando em trabalhar pelo bem comum, pelo homem do campo, pelos pobres. De repente, exatamente por causa desse ideal, foi declarado inimigo do Estado, preso, deposto do cargo para o qual foi eleito pelo voto popular livre, e condenado a viver por quase vinte anos no exterior, proibido de retornar ao seu Pa�s.
Assim foi com Miguel Arraes e com v�rios outros. Alguns voltaram, mas desistiram de lutar. Outros amargaram seq�elas permanentes. O ex-governador deposto optou por levantar a cabe�a e buscar, novamente, o campo de batalha.
Nacionalista, por�m aberto as mudan�as no mundo. Duro cr�tico dos oligarcas e dos monop�lios. Defensor ardoroso do homem simples, oprimido. Assim era Miguel Arraes.
Mas Arraes tamb�m era o marido de Madalena, pai de dez filhos, avo, bisavo. Gostava de arte e literatura. Fumava cachimbo e charuto. Apreciava um bom u�sque e a comida regional. Um retrato modesto de um homem de bem, que tirou da vida o que ela pode lhe oferecer, sem reclamar mais. E deixou uma enorme li�ao de humanidade.
S� temos que agradecer.
S�rgio Montenegro Filho
(rep�rter especial da Editoria de Pol�tica do Jornal do Commercio- Recife)
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