06 julho 2009

Alma, garganta abaixo

Era cedo e naquele dia havia menos gente que o habitual. Nem sempre são as mesmas pessoas mas, dois ou três costumam estar lá mesma hora que eu. Quando me atraso um pouco percebo que há mais gente um pouco mais tarde. De fato percebo que quando chego ainda há movimento para deixar as coisas no lugar. Então os funcionários passam com bandejas de queijos, pães assado, café, leite e estas guloseimas que fazem parte do nosso café da manhã. Sentei no balcão como sempre já com minha xícara de café com leite e pedi para que providenciasse o meu habitual pão assado. Então, durante a minha espera pude perceber ao meu lado que as mãos dele tremiam muito. Mantinha quase sempre o rosto para baixo. Devia ter, pelo que disfarçadamente pude perceber, uns 40, 45 anos. Era jovem ainda. No balcão estavam duas garrafas de cerveja já vazias e um copo ainda cheio que ele foi bebendo muito rapidamente com aquelas mãos trêmulas. Era cedo ainda. E ele já tinha bebido duas garrafas de cerveja, embora uma bebida leve, para mim me parecia pesada para aquela altura do dia. Claro que não pude deixar de me sentir profundamente envolvida com aquela situação. No dia anterior, li mais sobre alcoolismo e busquei telefones e endereços de ajuda profissional. Há dois ou três anos tenho passado por este problema com uma pessoa muito querida. Como dói ver uma pessoa se destruir diante de um copo. Pela garganta abaixo se supõe desaparecer problemas, frustrações, dores, falta de amor entre outras coisas. Pela garganta também perdemos dignidade, respeito, clareza, força. Pela garganta se vai o que se acumula na alma pesando imensamente sobre um corpo frágil.
Quis chorar. Tentei não deixar transparecer meu incômodo, meu desespero, minha angústia. E ele tremia ao meu lado. Tremia também minha alma.

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